
Trinta dias após a deflagração da Operação Sem Desconto, conduzida pela Polícia Federal (PF) e Controladoria-Geral da União (CGU), o escândalo envolvendo o desconto indevido de mensalidades de aposentados e pensionistas do INSS por associações continua cercado de dúvidas, lentidão e carência de respostas efetivas por parte do governo federal, especialmente em relação ao ressarcimento das vítimas do golpe bilionário.
O caso ganhou proporção nacional no dia 23 de abril, quando a operação revelou que entidades associativas cobraram, sem autorização, valores mensais de beneficiários da Previdência. Até ontem, cerca de 1,9 milhão de os foram registrados nas plataformas digitais do INSS para checar a existência de descontos. Apenas 2,1% dos segurados disseram ter autorizado formalmente as cobranças. Até o momento não foi apresentado qualquer plano oficial de restituição dos valores descontados.
A primeira fase da apuração, segundo o governo, é a consolidação de dados, para então iniciar a verificação de quem realmente foi prejudicado. Investigação No total, 41 entidades estão sob investigação, mas apenas 12 delas tiveram bens bloqueados — no valor total de R$ 2,56 bilhões — por decisão da AGU. Essas entidades também são alvo de Processo istrativo de Responsabilização (PAR) junto ao INSS. o lobista Antônio Carlos Camilo Antunes, conhecido como o Careca do INSS, é investigado como principal articulador da fraude. A AGU afirma que todas as organizações citadas serão investigadas, porém o processo será feito por etapas, com critérios ainda não divulgados.
A condução política do caso tem gerado desgaste ao governo Lula. O presidente do INSS à época, Alessandro Stefanutto, foi exonerado no mesmo dia da operação, mas a primeira fala pública do presidente Luiz Inácio Lula da Silva só ocorreu oito dias depois, em 1º de maio, em rede nacional. Já o então ministro da Previdência, Carlos Lupi, caiu após pressão da oposição e declarações consideradas insensíveis. O Congresso reagiu com força. Um pedido de Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (MI) para investigar o caso foi protocolado com apoio de 36 senadores e 223 deputados — 51% deles da própria base governista. O Planalto tentou barrar o avanço das s, sem sucesso e, agora, quer ocupar os principais postos do colegiado e neutralizar a oposição.
Sem explicação
Enquanto os bastidores políticos fervem, milhões de aposentados aguardam explicações e soluções. José Alberto Rodrigues, de 70 anos, aposentado e morador de Goiânia, descobriu recentemente que mais de R$ 80 eram descontados mensalmente de seu benefício para uma associação que ele desconhecia. “Eu tenho certeza de que não autorizei nada. Nunca fui de sindicato ou associação”, relatou.
Ele tentou ar o extrato detalhado de sua aposentadoria pelo aplicativo Meu INSS, mas não conseguiu identificar o início dos descontos. “Eu, sinceramente, não consegui. Não consigo identificar desde quando parte da minha aposentadoria é doada irregularmente”, lamentou.
Questão antiga
Para o advogado Raymundo Nonato Filho, presidente da Associação Brasileira de Defesa dos Clientes de Operações Financeiras e Bancárias (Abradeb), o problema não é recente. “Pegamos esses casos nos últimos 10 anos. Estamos falando de 10 milhões de brasileiros atingidos”, estimou. Segundo Nonato, o rombo pode chegar a R$ 9 bilhões, considerando o período entre 2015 e 2024.
A preocupação do Executivo é que a MI acabe politizando a investigação e atrasando os pagamentos. Para milhões de brasileiros como José Alberto Rodrigues, no entanto, a preocupação é mais simples e urgente: recuperar o que foi indevidamente tirado. “Espero que eles paguem. A gente só quer o que é nosso.”

Fernanda Strickland
RepórterFormada em jornalismo na Universidade Paulista (UNIP). É repórter de economia do Correio Braziliense desde 2020. Participou do Estágio de Correspondentes de Assuntos Militares (ECAM) 2019. Já ou pelas assessorias de comunicação da Embrapa e do IFB.

Francisco Artur de Lima
RepórterJornalista soteropolitano em Brasília, com experiência nos jornais O Estado de S.Paulo e A Tarde. Hoje, integro a equipe da editoria CB Online