
A disparidade entre a elite corporativa e a classe trabalhadora nunca foi tão gritante. Um novo levantamento da Oxfam Internacional, divulgado às vésperas do Dia do Trabalhador, revela que a remuneração média dos CEOs em 2024 alcançou os US$ 4,3 milhões — um aumento real de 50% em relação a 2019. No mesmo período, o salário médio dos trabalhadores teve crescimento de apenas 0,9%.
“Ano após ano, vemos o mesmo espetáculo grotesco: a remuneração dos CEOs dispara, enquanto os salários dos trabalhadores mal se mexem. Isso não é um defeito no sistema — é o sistema funcionando exatamente como planejado, canalizando riqueza para cima enquanto milhões de trabalhadores lutam para pagar aluguel, comida e saúde”, denuncia Amitabh Behar, diretor executivo da Oxfam Internacional.
O estudo analisou dados de quase 2 mil corporações em 35 países, com informações públicas extraídas da base S&P Capital IQ. A diferença de rendimentos chega a extremos: os bilionários acumularam, em média, US$ 23.500 por hora no último ano — valor superior à renda média anual global, estimada em US$ 21 mil.
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Na Alemanha, o CEO da BioNTech, empresa que lucrou com a vacina contra a covid-19, embolsou um pacote de US$ 274 milhões em 2024. O valor médio da remuneração de executivos na Irlanda e Alemanha também chama atenção: US$ 6,7 milhões e US$ 4,7 milhões, respectivamente. Já na África do Sul, os CEOs receberam, em média, US$ 1,6 milhão.
O abismo se acentua quando se observa a desigualdade de gênero. Mesmo com uma leve melhora, ando de 27% para 22% entre 2022 e 2023, as mulheres ainda trabalham, na prática, “de graça” às sextas-feiras. No Brasil, a situação se agravou: mulheres receberam 20,7% a menos que os homens em 2023, ante 19,4% no ano anterior. Para mulheres negras, o quadro é ainda mais alarmante — a diferença pode ultraar 50%.
“Estamos vendo na prática como as desigualdades históricas se perpetuam. Quando uma mulher negra precisa trabalhar o dobro para ganhar o mesmo, fica claro que o racismo e o machismo, frutos de uma herança colonial, ainda ditam as regras do jogo no mercado de trabalho”, alerta Viviana Santiago, diretora-executiva da Oxfam Brasil.
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Além disso, apenas 7% das empresas com CEOs que ganham acima de US$ 10 milhões têm uma mulher no comando. A Confederação Sindical Internacional (ITUC), que assina o relatório com a Oxfam, também chama atenção para o papel das grandes corporações na manutenção dessa estrutura desigual.
“A desigualdade escandalosa entre a remuneração dos CEOs e dos trabalhadores confirma que falta democracia onde ela é mais necessária: no trabalho. Ao redor do mundo, os trabalhadores são privados do básico para viver enquanto as corporações registram lucros recordes, sonegam impostos e fazem lobby para evitar responsabilidades”, afirma Luc Triangle, secretário-geral da ITUC.
A Oxfam e a ITUC pedem aos governos medidas concretas para enfrentar o problema: aumento de impostos sobre os super-ricos, alíquotas de até 75% sobre a renda dos mais abastados e garantias legais para salários dignos, direito à sindicalização e igualdade de oportunidades no mercado de trabalho.