A invasão de áreas públicas e a grilagem de terras são problemas recorrentes no Distrito Federal. Dados da Secretaria de Estado de Proteção da Ordem Urbanística (DF Legal) mostram que, no ano ado, foram realizadas 873 operações (veja quadro) para recuperar áreas ocupadas irregularmente, um aumento de 5,81% em relação a 2023, quando houve 825 registros.
Plano Piloto e Vicente Pires são as regiões onde ocorreram ações de derrubada de quiosques comerciais a moradias. Neste ano, somente até 9 de abril, a DF Legal realizou 208 operações — média aproximada de duas por dia.
Para enfrentar esse crime, o governo e as forças de segurança apostam no reforço do monitoramento de todo território do DF por meio de equipes de campo, drones ou imagens de satélite, conforme explica Alexandre Sena, subsecretário de Operações da DF Legal.
"A unidade de geoprocessamento da DF Legal, que monitora o território do DF por satélite em parceria com a Sema, o Ibram e o programa Brasil Mais, tem promovido o mapeamento completo do território. A unidade também aplica o fluxo de operações pronto emprego para desconstituir parcelamentos irregulares e invasões de áreas públicas", explica.
De acordo com Sena, esse trabalho conta ainda com a parceria das forças de segurança, istrações regionais e diversos outros órgãos que ajudam em todas as fases das ações, tanto com denúncias como com o apoio de maquinário e pessoal.
Delegado-chefe da Delegacia de Meio Ambiente da Polícia Civil (Dema/PCDF), Douglas Fernandes ressalta o esforço em conjunto. "Esse trabalho, envolvendo a Polícia Civil, o Ibram, a DF Legal e a própria Terracap, é fundamental para coibir esses parcelamentos, principalmente aqueles que estão em fase inicial", destaca.
O delegado pontua que, além das prisões efetuadas pela Dema, esse trabalho possibilita a aplicação de multas istrativas, tanto pelo Ibram como pela DF Legal, além da demolição dessas obras irregulares. "Isso é essencial para oferecer uma melhor solução a esse tipo de crime, que causa um dano gravíssimo não só para a presente geração, mas também para as futuras", avalia.
O promotor de Justiça Dênio Moura, da Promotoria de Justiça de Defesa da Ordem Urbanística (Prourb/MPDFT), disse que o órgão atua principalmente em três esferas para combater a grilagem: penal, cível e istrativa. "Na esfera penal, processando crimes de parcelamento irregular do solo e ambientais, podendo incluir lavagem de dinheiro e organização criminosa. Na área cível, utiliza ações civis públicas para restaurar a ordem urbanística ou recuperar danos ambientais. istrativamente, o Ministério Público fiscaliza os órgãos do Distrito Federal, o que abrange a elaboração, implementação e controle da política de uso e ocupação do território distrital", pontua.
Além disso, segundo Moura, o MPDFT tem procurado desenvolver ferramentas próprias de monitoramento do território, sobretudo com o uso das geotecnologias. "Mas é necessário deixar claro que o primeiro combate à grilagem de terras e ao parcelamento irregular deve ser feito pelos órgãos que compõem a estrutura de fiscalização da União e do GDF", pondera.
Doutor em desenvolvimento sustentável pela Universidade de Brasília (UnB), Christian Della Giustina ressalta que, entre as motivações para a ocupação irregular do solo, estão o crescimento acelerado da população e a baixa oferta de moradias.
"Nas últimas décadas, a população do DF tem crescido a uma taxa de 50 mil habitantes por ano. No entanto, o processo de oferta de novas moradias, que envolve a aprovação de projetos e o licenciamento ambiental, é extremamente oneroso e demorado, podendo levar até cinco anos para aprovar um novo loteamento ou uma área de expansão urbana", comenta.
Proteção ambiental 45694h
Segundo o especialista, como não há tanta oferta regular, e a que existe é muito mais cara, os grileiros se aproveitam da fiscalização precária e dessa demanda por habitação, e acabam ocupando áreas ociosas, normalmente de proteção ambiental. Em relação aos perigos dessa ocupação desordenada, Della Giustina alerta que a grilagem não prevê a área de infraestrutura, de drenagem, de abastecimento com água potável ou de esgoto.
"Essa ocupação é feita de forma precária e, muitas vezes, há fossas ao lado de poços de abastecimento, que acabam sendo contaminados", observa. "Além disso, a falta de drenagem proporciona alagamentos e enxurradas. Assim, toda a sociedade sofre sob diversos aspectos", acrescenta.
Benny Schvarsberg, professor de urbanismo e planejamento urbano na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU/UnB), reafirma que os perigos da ocupação desordenada são as consequências danosas — às vezes irreversíveis — na infraestrutura urbana e no meio ambiente para toda a coletividade, que paga pela infraestrutura em impostos e taxas, em benefício de poucos.
Desafios e soluções 104y15
De acordo com o promotor Dênio Moura, os principais desafios do combate à grilagem am pela "cultura da regularização" que se instalou no Distrito Federal. "Até pessoas de classe média e alta se sentem no direito de ocupar e construir ilegalmente", critica.
Além disso, ele ressalta a exploração econômica e político-eleitoral dessa situação. "Ela se manifesta, eventualmente, na forma de omissão, conivência ou até mesmo de incentivo estatal às ocupações irregulares, inclusive por meio das reiteradas promessas de regularização", opina.
Segundo Benny Schvarsberg, a solução para tentar frear essa prática a pela criação de políticas públicas preventivas de planejamento e ordenamento territorial. "Especialmente as habitacionais. Além disso, é preciso ter sistemas de monitoramento que coíbam, de forma eficaz, a ocupação irregular nas áreas privilegiadas e nobres, e respeitando os direitos da população nos territórios populares", avalia.
Além das políticas habitacionais, Christian Della Giustina destaca a importância da fiscalização. "Observam-se várias ocupações espalhadas pelo DF e há uma vista grossa por parte das autoridades. Elas vão crescendo até o momento em que a situação se torna irreversível", alerta. "Nesse caso, o Estado é obrigado a regularizar, gerando mais gastos do dinheiro público para remediar todos os impactos que a ocupação desordenada acarreta", lamenta.